sexta-feira, 16 de março de 2012

Francis


Na carteira de identidade, uma foto com a camiseta do Slayer. O cabelo em desalinho, grandes cachos pretos povoavam a testa e se emaranhavam em várias direções- para cima, para os lados. A louca bagunça parecia em harmonia com os olhos sagazes, bem marcados com o preto forte dos cílios. Ele olhavando para a objetiva, as sobrancelhas cerradas, os lábios tensos e um aspecto grave. Por detrás dos olhos duros, pensamentos tão enrolados e caóticos quanto os cabelos que os cobriam e encobriam. Em sua inocente juventude, o espanto criava espaço para a loucura, crescente e presente e parte de sua própria natureza. Ele compreendia que não poderia ser o artista da representação enfeitada artificial e serena. As garatujas horríveis, o humor cáustico e o terror sombrio não eram coisas presentes somente do lado de dentro, em uma caverna obscura e de acesso impossível, mas belezas a serem admiradas e vivenciadas na crueldade clara do meio-dia.
Francis sabia que o açougue vendia carne humana. Podia sentir o cheiro estranho de uma carne que não era de vaca que não era de porco que não era de frango que não era que não era. Canibalismo. Assassinatos aconteciam todos os dias, pessoas desapareciam e ele não poderia confiar que todas essas pessoas eram calma e respeitosamente enterradas em um campo pacífico. Ninguém é assim tão ético. Sendo ele próprio também feito de carne, poderia apenas concluir que ele também estava no alvo dos açougueiros canibais. Tinha certeza de que aquelas costelas estavam pequenas demais para ser de boi e que ele não permitiria ser devorado como uma caça.

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