terça-feira, 5 de junho de 2012

Mestranda

De cara enfiada nos livros desde cedo, sentido surreal ter de manter a bunda colada à cadeira, as mãos pregadas às páginas, os olhos vidrados nas letras pretas impressas em papel branco. Mais ainda, sentindo impossível ter de manter a mente e o coração focados no conhecimento contido nos livros encadernados. Mas mente-coração feito de neurônios, músculos e sangue não dão conta de um tempo que ainda não chegou. O rito é claro e a clausura é mais um dos seus componentes, o dos mais clássicos. O pergaminho substituído por PDF, mas a aspiração talvez continue constante. A mesma. Fazendo enclausurar o corpo forte, faminto, navegador. A mente que queria mais era velejar, o coração queria mais era amar. Mas os livros mudaram as fibras do coração, também. Abandonei muitos dos prazeres em troca dos segredos dessas páginas velhas. Tudo porque a aspiração ainda é a mesma, por mais que o tempo seja outro. Essas pessoas que pensam parecem sempre anacrônicas. Estranhas, elas. Tudo o mais conspira para que se mantenha cego-surdo-mudo, com o grito ocasional de quem não tem mais nada a fazer, aprendendo menos do que o necessário, acostumados a muito pão, muito pó e poucas páginas. Mas não. Se a pergunta contém a resposta, minha pergunta é inesgotável. Quero vê-la em palavras nos meus livros. Os livros que são meus, sob os meus dedos e meus auspícios. Nem santos, nem pó. Perecíveis e parecidos assim comigo. Eternos no hoje. O sol comendo lá fora e eu quero mais é saber dos livros. Eterna no hoje, porque amanhã eu surto e quero mais é saber da cama. Estudante tem dessas.